12/12/2013

Calendário



Estou sendo abordada constantemente por um sentimento que se diz chamar Saudade. A tal chegou de mansinho, batendo na minha porta, pedindo para entrar porque "a chuva lá fora está alagando tudo o que vê pela frente". Acho que é por você estar viajando e a casa estar vazia que eu a deixei entrar, toda ensopada, necessitando de um chá quente e um abrigo temporário até que as gotas lá fora se aquietassem na escuridão dos bueiros solitários.

Eu nem sei o porquê, mas essa estranha visita me incitou a procurar no celular por algumas fotos nossas, sorrindo meio abobalhados um pro outro, numa daquelas tardes de nada-pra-fazer, lembra? E daí, sem nem avisar, colocou pra tocar no Deezer (como ela descobriu que é meu passatempo escutar músicas nesse player?) a playlist que tem as músicas que você mais gosta.

Sim, já a chamei de abusada e tantos outros nomes que não me recordo mais. O problema é que essa senhora, além de ter se revelado uma conhecida, é bem insistente. Depois de um biscoito ou outro, me convidou a revisitar aquela caixinha onde guardei todas as pétalas das rosas que você me deu, as palhetas daquele violão, o mesmo que você disse que tocava pensando em mim. Pois é, meu bem, a querida e estimável Saudade me pediu para relembrar o cheiro do seu perfume favorito e inclusive, desenferrujar as cordas do outro violão, aquele que você tentava me ensinar a tocar nas tardes de verão.

É claro que eu comecei a ficar incomodada. Lágrimas estavam ameaçando descer pelo meu rosto e eu já não queria ocupar minha cabeça com os pensamentos que estavam surgindo. Era injusto, você precisava desse tempo único para se recuperar do estresse causado pelo ensino médio e espairecer. Duh, que bobeira a minha, ficar me preocupando com... A sua volta. Faltavam só três dias, que loucura ficar me roendo por causa disso.

Mas a culpa é dela, amor, foi ela. Ela me fez desenhar um calendário desalinhado no meu quadro de giz, marcando os dias que faltavam para que eu estivesse nos seus braços de novo. Foram as ordens dela que segui enquanto escrevia o meu próprio romance em que o mocinho era praticamente um espelho seu! Eu nem sei no que estava pensando, aliás, no momento em que resolvi assistir a cada filme que assistimos juntos (até o mais trash!), na companhia de um prato de pizza, um copão de Coca (normal, porque zero eu sei que você não gosta que eu tome) e claro, minha nova hóspede.

Vez em quando eu parava pra escutar aquela gravação que você fez para que eu dormisse melhor e me mandou pelo Facebook. Quando me deu na telha até procurei pelo cover que você gravou só pra mim! Sabia que era ele que me fazia companhia nas madrugadas em que o sono não chegava? Pode acreditar... E toda noite, só porque você colocou essa ideia na minha cabeça, eu parava para ver a lua, porque eu sabia que onde quer que você estivesse, estaria olhando pra ela também, assim como eu.

O tempo foi passando e eu fiz de tudo para te tirar da cabeça e mandar a Saudade embora. Só que sei lá, parecia que ela tinha gostado do meu cantinho e havia resolvido passar mais tempo aqui, tirando o fato de que a chuva no Rio de Janeiro não dava trégua de jeito nenhum, o que não melhorou tanto a situação. Antes de te escrever, já tinha tentado rearrumar meus livros na estante, adiantar alguma leitura, fazer as unhas e até mesmo aprender alguma música nova no violão, só pra te impressionar.

Mas se você perguntar se deu certo, vou ter que te desapontar com uma negativa (não consegui nem aprender a música nova porque sou um desastre com as cordas) e ver esse sorriso de dentes meio empurradinhos pra frente murchar num instante. Só pra você ter uma ideia de como minha hóspede podia se gabar de sua fama, até o livro que peguei para ler tinha uma passagem sobre ela. É claro que eu me identifiquei, mas a gente não precisa espalhar pra ela não sair falando por aí.

Só que no fundo eu sabia, ficou na minha consciência o pensamento de que você chegaria. Eu não sabia se a Saudade ia gostar dessa ideia, mas pouco me importava com o que ela achava ou deixava de achar. Acima de tudo, só queria voltar a ver vários filmes e episódios de Gossip Girl nos seus braços, te mimar com palavras de carinho e assistir enquanto as suas bochechas ficavam vermelhas num átimo. E mesmo que eu tivesse que acabar com o meu calendário inventado e mandar embora toda e qualquer visita com grosseria ou não, eu queria você de volta. Bem aqui. Juntinho de mim.



Fotografia por: Ricardo Veloso.
Texto por: Natalia Leal.


4 comentários:

Comentários
4 Comentários
  1. Nooooooooossa que texto lindo <3 teu blog é um encanto e você uma excelente escritora. Meus mais sinceros parabéns !

    http://pequenamiia.blogspot.com.br/

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    1. Oi, Kah!

      Jura que você gostou? Obrigada! <3

      Fico tão feliz pelo comentário positivo... Só me incentiva a escrever mais e mais, hehe.

      Beijos,

      Natalia Leal

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  2. Olá Natalia!
    Meu deus, eu não sabia que você era capaz de escrever tão bem assim!
    Adorei a foto também >< rs.
    Parabéns pelo texto, ficou maravilhoso!
    Beijos,
    Ana M.
    http://addictiononbooks.blogspot.com.br/

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    1. Oi, Ana!

      Own! Muito obrigada, sério mesmo! Comentários assim só me fazem crescer mais e mais :D

      Obrigada! O Ricardo arrasa, adoro as fotos dele.

      Beijos!

      Natalia Leal

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