02/03/2014

País das Maravilhas



Eu corro atrás do coelho branco, como se ele representasse cada conquista que pode se tornar realidade. Escalo árvores, vejo as coisas se virando de cabeça para baixo e do mesmo jeito que se bagunçaram, colocando-se em seus devidos lugares. Avisto uma ponte, mas não sei se é seguro o bastante atravessá-la. Minhas decisões me confundem e, por fim, acabo caindo em um abismo.

A cada minuto que se passa, observo a escuridão ao meu redor. Já não sei mais onde estou, o motivo da queda e o porquê de ela parecer não ter fim. É angustiante o quanto me cobro estar firme novamente, no chão. A gravidade simplesmente não me obedece e continuo girando e girando no ar, sem rumo definido.

É quando, finalmente, caio. A queda me deixa dolorida e enche meus olhos de lágrimas, o ar me fugindo dos pulmões. Quase sem forças, tateio pelo chão em busca de um pontinho de luz que se vê ao longe. A passagem é estreita, mas acabou visualizando algo que espalha um arrepio pela minha espinha: um rabinho branco e felpudo.

Subitamente, me recupero e rastejo em busca do animalzinho ligeiro. Pedaços de raízes que eu nem tinha notado se enroscam em meus pés e me puxam para trás, tentando fazer-me desistir. Determinada demais para parar, arranho-as com as unhas recém-pintadas até que desfaçam os nós em torno de meus tornozelos, dando continuidade a minha busca. Franzo as sobrancelhas e só penso em continuar... Correndo.

Espinhos arranham o que resta do meu rostinho bonito, agora cheio de terra e parcialmente ferido. Entre um tropeço e outro, tento alcançar o rabinho do coelho e por pouco não consigo, tendo o bichinho entrado por uma portinha dourada. Percebendo que perdi a melhor das chances, me deixo cair no chão e desato a chorar, cobrindo as mãos ante o vazio do lugar.

Injuriada, deixo um grito gutural escapar por meus lábios e esmurro a minúscula porta. Não sou Alice. Não tenho a droga de um líquido que me faça diminuir assim que eu terminar de bebê-lo. Eu tentei. Tentei! E não consegui. Por que? In(justiça)? E agora, serei castigada por uma rainha de copas ou absolvida por algum rei metido a besta? Pior de tudo, haverá a chance de milhões de gatos risonhos rirem da minha cara? Não, isso não!

O barulho de meus questionamentos é tão alto que o coelhinho resolve sair pela portinha e verificar o que está acontecendo. Bichinhos inconvenientes, eles, só aparecem quando querem. Num átimo, fico em silêncio e observo seu par de olhos vermelhos piscando freneticamente em minha direção, um passo em falso e eu corro o risco de perder a batalha. Então, ele dá um salto e pula em meu pescoço, enterrando seus dentes em minha pele macia. Nada me resta, senão a eterna escuridão.


Fotografia por: Ricardo Veloso
Texto por: Natalia Leal


4 comentários:

Comentários
4 Comentários
  1. Gostei do texto Natalia e da alusão feita à Alice no País das Maravilhas. Belas e intensas palavras! Beijo!


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    1. Oi, Vanessa!

      Muito obrigada, fico imensamente feliz que tenha gostado. Esse texto tem muita importância para mim ♥

      Beijão,

      Natalia Leal

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  2. Eu sabia! Eu sabia! Sabia que esses coelhinhos brancos de olhos vermelhos eram malignos! Nunca gostei deles! haha Amei o texto!
    Letras & Versos

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    1. Oi, Gabby!

      Fofinhos, porém malignos. É isso mesmo, hahahahaha. Obrigada!

      Beijão,

      Natalia Leal

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